Prof. Dra. Maria Margareth Escobar Ribas Lima-UFMS
O Município de Corumbá, localizado à margem direita do Rio Paraguai na fronteira oeste do Brasil com a Bolívia, possui 64.965 Km2 fazendo divisa com os municípios de Porto Murtinho, Bodoquena, Miranda, Aquidauana, Rio Verde, Coxim e Sonora, foi fundada em 21 de setembro de 1778 pelo Capitão-General Luiz de Albuquerque, cujo objetivo principal foi delimitar e assegurar o domínio português na então Capitania de Mato Grosso (Fig. 01).
FIGURA 01: Localização do Município de Corumbá em Mato Grosso do Sul. FONTE: Lauzie Xavier. PEP/IPHAN. 2004.
Inicialmente denominada Povoação de Nossa Senhora da Conceição de Albuquerque, conservando-se por alguns anos como simples destacamento militar transformou-se lentamente em povoação. Ainda no século XVIII, sob a forma de uma fortificação militar, a cidade servia como ponto de apoio à garantia da navegabilidade no rio Paraguai em face da instabilidade de segurança da fronteira e aos constantes ataques dos índios que povoavam o Alto Paraguai, hostis à presença dos colonizadores (Fig. 02).
No período de 1864 a 1870, foi assolada pela Guerra do Paraguai, quando foi invadida e ocupada pelas tropas de Solano Lopes em 1861, sofrendo os efeitos da Guerra testemunhado, sobretudo, pela destruição de uma incipiente infraestrutura aí instalada, além da quase dizimação do seu contingente populacional, tanto pelas batalhas de invasão e reconquista quanto pela epidemia de varíola que sucedeu o pós-guerra.
Após esse período, com a sua retomada em 1867 e também com fim da Guerra do Paraguai em 1870, Corumbá passa a apresentar um considerável crescimento populacional e comercial, por conta da vinda de inúmeros estrangeiros (portugueses, italianos, franceses, espanhóis, alemães, árabes, uruguaios, argentinos, bolivianos e principalmente paraguaios) atraídos pela possibilidade de obter lucros com diversas atividades que afloravam na região. Segundo ALVES (2000, p. 140):
“Com a entrada maciça de mercadorias inglesas em seus portos fluviais, Mato Grosso começou a experimentar, também, o luxo e o consumo ostensivo, apreendendo, inclusive por meio desses indicadores, o significado do progresso capitalista. Não que o capitalismo se constituísse numa experiência propriamente nova para a Província, pois toda a sua história fora capitalista. O progresso, sim, era um componente novo, e se toma referência no século XIX. ”
FIGURA 02: Planta da Povoação de Albuquerque levantada pelo sargento-mor José Antônio Pinto de Figueiredo, datada de 1°de abril de 1789. FONTE: Cronologia de Corumbá/MS. Lauzie Xavier. PEP/IPHAN. 2004.
Foi através do Rio Paraguai, que Corumbá prosperou como principal entreposto comercial interligado com a capital Rio de Janeiro e com os países da Bacia do Prata. Esse fluxo de pessoas advindas de outras nações e de outras regiões do próprio Brasil, trazendo seus costumes, suas crenças, suas tradições, suas técnicas e práticas possibilitou a formação de um mosaico cultural peculiar.
Sob o aspecto histórico, Corumbá constitui um dos mais antigos núcleos urbanos do atual Mato Grosso do Sul e de toda a porção oeste do Brasil, constituindo-se em um baluarte militar capaz de garantir a defesa da desguarnecida fronteira da colônia lusitana na capitania de Mato Grosso contra as invasões castelhanas.
Destaca-se também que, navios transatlânticos ligavam Corumbá às cidades de Buenos Aires, Assunção e Montevidéu, bem como a várias cidades europeias além da presença dos poderosos “mascates fluviais”, dentre os quais se posta com grande importância, o português Manoel Cavassa, que fizeram do porto fluvial de Corumbá o terceiro maior da América Latina até 1930. Nesse momento, as casas comerciais em Corumbá dispunham de acesso privilegiado aos mercados dos grandes centros urbanos da época, o que lhe possibilitava o controle de preços das mercadorias e das suas tendências nessas fontes.
Até a década de 50, os Rios Paraguai, Paraná e Prata (Fig. 03) eram os alguns meios de comunicação da região. Assim, a cidade vivia sob a influência dos países da Bacia do Prata, dos quais herdou grande parte dos seus costumes, hábitos e linguagem; isso ocorreu naturalmente devido à sua localização fronteiriça e ao isolamento físico que sofria na época, distante das demais cidades brasileiras.
FIGURA 03: Mapa do Rio Paraguai e Rio Paraná formadores da Bacia Platina. Fonte: Maria de Fatima Costa (1999).
A partir daí, observou-se o desenrolar de um constante processo de reorganização espacial, que marcou um considerável acervo de prédios históricos ainda hoje presentes na região mais antiga a cidade e que constituiu o núcleo inicial a partir do qual se processou sua expansão urbana.
A cidade, na década de 1940, iniciou também atividades industriais, com a exploração das reservas de calcário - componente para a indústria do cimento – além de outros minérios, exploração esta, presente na região até os dias atuais.
Porém, foi nesta mesma década de 40, com a chegada da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil cuja ligação ferroviária ocorreu com a finalização da construção da Ponte Ferroviária Eurico Gaspar Dutra no Rio Paraguai, que se faz a mudança do curso da história e da economia local (Fig. 04).
Essa situação ocasionou o abandono do porto e o transformou em uma região decadente, onde os antigos prédios em que funcionavam importantes casas comerciais foram sendo transformados em habitações coletivas, as quais passaram a ser ocupadas por populações de baixa renda, geralmente compostas por famílias desalojadas pelas cheias do Pantanal as quais se refugiavam na cidade, onde passavam a ocupar esses imóveis abandonados.
Devemos lembrar que, os imóveis remanescentes que hoje compõem o patrimônio ambiental urbano de Corumbá começaram a ser construídos no período pós-guerra do Paraguai, no período de 1870 a 1920 (Fig. 05).
FIGURA 04: Ponte Ferroviária Eurico Gaspar Dutra no Rio Paraguai, obra finalizada no final da década de 40. FONTE: e Acervo da Autora.
FIGURA 05: Vista aérea da cidade de Corumbá com o primeiro plano do casario do porto hoje protegido pelo tombamento em níveis Municipal e Federal. FONTE: Prefeitura Municipal de Corumbá. (1999).
Em 1985, com o propósito de preservar e proteger valores históricos e culturais, o então prefeito Fadah Scaff Gattas decreta como Patrimônio Histórico Municipal, o Casario do Porto Geral de Corumbá (Decreto 129/85). Em 1992 é criada a Zona Especial de Preservação Ambiental e Paisagística do Porto Geral de Corumbá. E, em 1993 o Conjunto Histórico, Arquitetônico e Paisagístico do Casario do Porto Geral de Corumbá foi tombado pelo IPHAN - Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Processo nº 1182-T-1985). O Conjunto Arquitetônico foi inscrito no Livro Histórico, no Livro Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico e no Livro de Belas Artes em 28 de setembro de 1993(Fig. 06).
FIGURAS 06: Vista do rio Paraguai no porto de Corumbá, onde esta parte da área tombada. FONTE: IPHAN/MS. (2008).
O Município de Corumbá também integra um dos mais importantes complexos ecológicos do planeta denominado Pantanal, o qual apresenta exuberância paisagística e riqueza de diversidade biológica. O Pantanal é uma Reserva da Biosfera, declarado como Patrimônio Mundial pela UNESCO em 1981 e reconhecido Patrimônio Nacional pela Constituição Brasileira em 1988, ocupando 60% do território do Município de Corumbá.
Pode-se também citar valores artísticos como a Praça da Independência, um desses exemplos da exuberância arquitetônica na cidade que, para a época, apresentava elementos paisagísticos peculiares e modernos para este local, como o lago com pontes, coreto e estátuas em mármore com temática das estações do ano (Fig. 07).
FIGURA 07: Praça da Independência década de 1950 e imagens das Estatuas em mármore, o Coreto e Pontes no lago. FONTE: Imagem retirada: www.facebook.com.br/corumbamemorias e Acervo da Autora.
Estes fatores motivaram chamar a cidade de Corumbá de Capital do Pantanal, constituindo-se assim, o principal portal para o santuário ecológico. Corumbá é uma cidade que apresenta diversas festividades que fazem parte do calendário cultural onde se podem apreciar os particulares aspectos culturais da região.
Enfim, o desenvolvimento, que muitas vezes permite destruir a história e a cultura local, principalmente a arquitetura, no caso de Corumbá, chegou com menor intensidade permitindo assim, que os diversos edifícios, ainda existentes, além dos significantes registros dos valores histórico-culturais, testemunhem a peculiar e valorosa história desta cidade do século XVIII em um contexto inóspito como era o Pantanal.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AYALA S. C, Simon, Feliciano. Álbum Gráphico do Estado de Mato Grosso, Prefácio; São Paulo – SP. Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2006. 433pp.
ALVES, Gilberto Luiz. A casa comercial e o capital financeiro em Mato Grosso: 1870- 1929.Campo Grande- MS: 2ª Edição Revisada. 2000.
COSTA, Maria de Fatima. A História de um país inexistente: O pantanal do século XVI e XVIII. São Paulo: Kosmos, 1999.
FERNANDES, César da Silva. Relatório de Pesquisa Histórica. Projeto de Intervenção do Patrimônio Edificado de Corumbá. Programa Monumenta. Corumbá-MS. Jul/2009.
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Cadeira nº. 19:
Patrono: Hernando Elpidio Ribas
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